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Tricotilomania

Foto do escritor: pridelneropridelnero

Atualizado: 5 de ago. de 2020

TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL EM PACIENTES COM TRICOTILOMANIA: REVISÃO DE LITERATURA


COGNITIVE-BEHAVIOR THERAPY IN PATIENTS WITH TRICHOTILLOMANIA: LITERARY REVISION


Maria Cecília Cól Del Nero1 , Cristiano Nabuco de Abreu2


1 Psicóloga clínica, hospitalar e terapeuta cognitivo-comportamental pelo AMBULIM - Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (Ipq-HCFMUSP)


2 Psicólogo clínico, mestre e doutor em Psicologia Clínica.Coordenador da equipe de Psicologia do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares (AMBULIM) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HCFMUSP. Diretor do Núcleo de Psicoterapia Cognitiva de São Paulo.


Endereço para correspondência:

Maria Cecília Cól Del Nero


Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

R. Dr. Ovídio Pires de Campos, 785 - Caixa Postal 3671 CEP 01060-970- São Paulo - SP Junho / 2008

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DEL NERO, Maria Cecília Cól. Terapia cognitivo-comportamental em pacientes com tricotilomania: revisão de literatura. 2008. 23f.. Monografia (Especiaização em Psicologia) - Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.



RESUMO


Contexto: O termo Tricotilomania (TTM) resulta da combinação de três palavras gregas: trich (cabelo), tillo (arrancar) e mania (loucura ou excesso de atividade). O nome mania daria a alguns uma conotação pejorativa de “pessoa louca” ou doente mental. No entanto, atualmente é classificado pelo, DSM-IV, como sendo um “Transtorno do Controle dos Impulsos”. Objetivo: O objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão convencional da literatura sobre as publicações que abordam a tricotilomania e a efetividade do tratamento da terapia cognitivo-comportamental (TCC). Método: Para tanto, realizou-se a busca de artigos pelos indexadores MEDLINE e LILACS e inclusão de artigos e livros que apresentaram dados sobre TTM e TCC cobrindo o período compreendido entre 2003 e 2007. Resultados: Várias áreas da área de saúde têm se voltado para o estudo da tricotilomania sendo que os tratamentos que se mostraram maior efetividade combinaram o tratamento farmacológico com TCC. Conclusão: A TCC tem sido amplamente utilizada para tratamentos de transtornos psiquiátricos apresentando resultados positivos. A maior parte dos estudos consultados nessa revisão revelou que a combinação de fármacos e tratamento psicoterápico tem se mostrado eficaz. No entanto verifica-se que a terapias com abordagens comportamentais, quando utilizada separadamente tem efeito superior quando comparados aos efeitos da farmacoterapia isolada.

Palavras chaves: tricotilomania, terapia cognitivo-comportamental e terapia comportamental.


SUMMARY


Context: The word Trichotillomania (TTM) results of the combination of three Greek words: trich (hair), tillo (to pull out) and mania (madness or excess of activity). The name mania would give some people the pejorative connotation of "insane person" or mentally sick person. However, it is currently classified by DSM-IV, as being an "Impulse Control Disease". Objective: The objective of this work was to carry out a conventional revision of the literature on publications that approach the trichotillomania and the effectiveness of treatment of the cognitive-behavior therapy. Method: For that, article searches were made by MEDLINE and LILACS indexes and articles and books that had presented data about TTM and cognitive-behavior therapy covering the period between 2003 and 2007 were included. Results: Several areas of the health area investigated the study of the trichotillomania and the treatments that showed greater effectiveness have combined pharmacological treatment with cognitive-behavior therapy. Conclusion: The cognitive-behavior therapy has been widely used for psychiatric disease treatments presenting positive results. Most of the studies consulted in this revision revealed that the combination of medication and psychotherapeutical treatment has been efficient. However, it was verified that therapies with behavioral approaches, when used separately, has higher effect when compared to the effect of isolated pharmacotherapy.

Keywords: trichotillomania, cognitive-behavior therapy and behavior therapy


1. INTRODUÇÃO


Durante toda a história da humanidade os cabelos sempre carregaram múltiplos significados: poder, sedução, castidade, força física, luxo, esplendor entre outros. Todas as culturas e povos e em todas as épocas, utilizaram penteados variados e exóticos representando códigos complexos para expressar etapas de suas vidas, respectivos papeis, seus status e as suas identidades culturais. Para os romanos, por exemplo, raspava-se a cabeça dos indivíduos considerados hierarquicamente inferiores (prisioneiros, escravos, traidores).

As doenças do cabelo e do couro cabeludo em algumas culturas ocidentais representam um preocupante problema existencial colocando em discussão a imagem corporal e o estado psíquico de homens e mulheres acometidos por afecções relacionadas à perda de cabelos.

Atualmente os cabelos perderam muito da função remota protetora, mas ainda marcam muitos pontos nos itens Beleza e Sedução. No entanto, mitos populares e crenças sobre os cabelos ainda persistem e são largamente disseminados, em sua maioria sem comprovação científica e, portanto levando a interpretação equivocada. Alguns deles dizem respeito a uso de chapéus e bonés, os quais causariam a queda de cabelos; lavar os cabelos todos dias podem levar a perda de cabelos; raspar ou cortar os cabelos fazem com que eles cresçam mais volumosos e mais rapidamente; permanentes ou descoloramento e tinturas dos cabelos podem causar calvície; caspa pode causar perda permanente dos cabelos; escovar os cabelos certo número de vezes por dia fará com que ele fique mais saudável; os folículos capilares podem ficar obstruídos, retardando ou impedindo o crescimento do cabelo; aplicação de óleo ou produtos especiais podem tornar os cabelos mais densos e com crescimento mais rápido; vitaminas especiais ou nutrientes podem ser usados para alimentar seus folículos capilares e aumentar o crescimento dos cabelos.1

No mundo animal a condição física, a idade e o nível de maturidade também são importantes quando tentam identificar potenciais parceiros ou rivais. Uma pele bem tratada mostra um animal com boa saúde e podem atrair animais do sexo oposto. A cor do pêlo dos animais indica se é jovem, muito velho ou se esta dentro de uma faixa etária para ser um parceiro potencial, e se é considerado um competidor / rival1.

Do ponto de vista biológico e funcional, o cabelo também pode desempenhar funções especiais em áreas específicas do corpo. Os canais de transpiração das sobrancelhas, por exemplo, mantém os fluidos fora dos olhos. Os cílios mantêm a poeira e partículas estranhas fora do olho, também atuam como detectores de sensibilidade que disparam o fechamento das pálpebras quando objetos estranhos chegam muito perto. Os pêlos do nariz ajudam a prevenir que a poeira e outras partículas sejam inaladas para os pulmões. O cabelo também aumenta a área da superfície do corpo além da pele para permitir mais rápida evaporação da transpiração, que esfria o corpo. Finalmente, folículos capilares estão conectados aos nervos sensoriais da pele, e colhe informação como forma de sensores táteis sobre o ambiente. Sempre que os cabelos são removidos, um sinal é enviado para áreas sensoriais do cérebro1.

O cabelo é objeto central de algumas patologias relacionadas aos atos auto-agressivos ou também chamadas de tricoses compulsivas sendo as mais freqüentes: tricotilomania, tricotemnomania, tricofagia, tricoteiromania, pseudoalopecia da coçadura, tricocriptomania, tricorrexomania e plica neuropática.2

Este trabalho dará ênfase às características clínicas e aos aspectos psiquiátricos dos pacientes com tricotilomania.


2. TRICOTILOMANIA


O termo tricotilomania (TTM) foi usado pela primeira vez pelo médico francês François Henri Hallopeau em 1889 na descrição de caso de um paciente que arrancava o próprio cabelo. O nome resulta da combinação de três palavras gregas: trich (cabelo), tillo (arrancar) e mania (loucura ou excesso de atividade). O nome mania daria a alguns uma conotação pejorativa de pessoa louca ou doente mental. No entanto, atualmente é classificado pela American Psychiatric Association's Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, DSM-IV, como Transtorno do Controle dos Impulsos, assim como a cleptomania, jogo patológico e a piromania1.

Embora a TTM seja classificada como um transtorno do controle dos impulsos pode ter alguma sobreposição fenomenológica com Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC). A questão que se apresenta é se a TTM é melhor conceituada como sendo um transtorno caracterizado pela impulsividade ou pela compulsividade. Um estudo comparando sintomas e os traços impulsivos e compulsivos foi realizado em 43 pacientes que se apresentaram para o tratamento de TTM, de TOC ou de transtorno de personalidade impulsiva. Os pacientes de TTM tiveram contagens significativamente mais baixas de sintomas obsessivos comparadas aos pacientes de TOC, e contagens significativamente mais elevadas para impulsividade. As medidas da agressão não diferiram significativamente entre os grupos3.

Semelhanças entre TOC e TTM têm sido amplamente discutidos. No entanto, há evidências de diferenças importantes entre estas duas doenças. Alguns autores têm conceituado o transtorno como sendo um espectro do TOC. Em contraste com as compulsões no TOC, o arrancar o cabelo na TTM não é em resposta aos pensamentos obsessivos (como se preocupar com danos a si mesmo ou a outros), mas sim por causa de um irresistível desejo e a promessa de gratificação ao arrancar o cabelo. Além disso, ao contrário de pacientes com TOC, cujos sintomas mudam ao longo do tempo em termos de incidência e gravidade (por exemplo, lavar as mãos para verificar bloqueios, fogões, eletrodomésticos, etc), nos pacientes TTM normalmente estão presentes apenas o arrancar o cabelo, sem evolução para rituais compulsivos auto-prejudiciais4.

As vantagens e desvantagens em estabelecer espectros do transtorno obsessivo compulsivo e suas implicações para o diagnóstico, tratamento e pesquisa. Embora o TOC seja classificado como um transtorno de ansiedade no DSM-IV, as considerações recentes direcionam para uma reclassificação no conjunto do Transtorno do Espectro Obsessivo Compulsivo (TEOC). As semelhanças na sintomatologia, curso da doença, população, e neurocircuito dos pacientes com TOC e de TEOC sustentadas pela comorbidade, pela família, e pelos estudos neurológicos, que igualmente oferecem uma reavaliação crítica da relação entre Transtorno obsessivo compulsivo e transtornos de ansiedade. Em sua opinião, uma reclassificação entre TOC e TEOC permitiria o exame mais minucioso de sintomas obsessivos distintos, que atualmente é detectado frequentemente nos pacientes que se queixam de sintoma de ansiedade5.

Os pacientes com TTM frequentemente apresentam outros hábitos nervosos que vão desde arrancar cutículas, contrair a face, chupar o dedo polegar, até beliscar, morder ou torcer os lábios ou balançar o corpo6.

A tricotilomania ou alopecia psicogênica é também observada entre os animais. Estudo realizado com felinos identificou dermatopatia de origem psicogênica, decorrente da lambedura compulsiva do pelame, realizada pelo gato em situações de estresse. É decorrente de alterações neuro hormonais e pode estar associada à introdução de novos animais e/ou crianças no ambiente. Além de mudanças de manejo e atitude para com o animal, sugere-se o emprego de ansiolíticos no tratamento da doença7.

Comportamentos de examinar a raiz do cabelo, arrancá-la, enfiar uma mecha entre os dentes ou tricofagia (comer cabelos) podem ocorrer na TTM. Uma das conseqüências é a formação de bezoares gastrintestinais que podem causar obstruções, intussuscepções, sangramentos, perfurações, além de enteropatias, pancreatites, apendicites, icterícia obstrutiva entre outras. O termo "bezoar" de origem árabe "bad-zehr" ou persa "pad-zehr" significa antídoto e genericamente define toda e qualquer formação encontrada no trato digestivo formada, espontaneamente, a partir da ingestão de várias substâncias. Os tipos mais comuns são os fitobezoares contendo fibras ou sementes de vegetais e os tricobezoares, compostos de cabelos ou pêlos8.

A sintomatologia dos bezoares é inespecífica, insidiosa e gradual e, não raro, intermitente, guardando estreita relação sintomática com a localização. À medida que avolumam-se os bezoares podem causar anorexia, perda de peso e desconforto abdominal relacionado às refeições. Quando ocorre a obstrução, vômitos e episódios de cólicas abdominais são os principais sintomas8.

Originados a partir da ingestão de cabelos, os tricobezoares são formados gradativamente no interior do tubo digestivo. Após a ingestão, os cabelos ou pêlos usualmente são retidos pelas dobras da mucosa gástrica, iniciando-se aí o processo de entrelaçamento dos fios. Os fluídos da dieta atravessam posteriormente a trama de fios, arrastando consigo resíduos alimentares para o seu interior; o que aumenta progressivamente o volume da formação originária. Em virtude da desnaturacão protéica dos cabelos pelo ácido do estômago, os tricobezoares assumem sempre a cor negra, independentemente da cor original dos cabelos. Felizmente e, por razões não esclarecidas, nem todos os indivíduos portadores de tricofagia desenvolvem tricobezoares, sendo possível, também, a sua resolução ou eliminação espontânea.8

Vaughan et al (1968)9 foram os primeiros a descrever a possibilidade de um tricobezoar estender-se desde o estômago até o cólon, através de uma grande cauda de fios presa à massa principal intra-gástrica. Esta formação recebeu o nome de Síndrome de Rapunzel, em alusão ao clássico conto de Jacob e Wilhelm Grim, de 1812.

Embora o hábito de arrancar os cabelos possa ter seu início em qualquer idade, é mais freqüente que se inicie ainda na infância ou na adolescência. Pesquisas com portadores de TTM indicaram que seu aparecimento ocorra entre onze e quinze anos de idade. No entanto observou-se que crianças entre seis e dez anos também são acometidas pelo problema. Existem relatos de crianças de dezoito meses que arrancavam o próprio cabelo, o cabelo da mãe ou fibras de seus brinquedos podendo indicar a presença do distúrbio. A Dra Susan Swedo e Marge Lenane (Penzel, 2003)1 utilizaram o termo Baby Trich para designar uma forma de arrancar cabelo em crianças ainda muito pequenas.


2.1 - EPIDEMIOLOGIA


Existem divergências quanto à prevalência de TTM na população. Alguns autores calculam que atualmente nos Estados Unidos, existam cerca de 11 milhões de pessoas acometidas pelo transtorno. No Brasil estudos sistemáticos sobre a prevalência ainda são precários, embora atualmente seja observado o transtorno com maior freqüência.

Um exame demográfico corrobora com a afirmação anterior de que a TTM é muito mais prevalente em mulheres (10:1) e o TOC é comum tanto em homens quanto em mulheres. A idade de início também difere um pouco. A TTM tipicamente tem seu início na adolescência, com a idade média de início do arrancar o cabelo mais tarde em homens do que em mulheres e o início do TOC é desde a infância até o início da idade adulta. Além disso, as observações clínicas apóiam a distinção entre TOC e TTM. Os pacientes com TTM tendem a ter menos comorbidade com sintomas obsessivos compulsivos, assim como memos depressão e ansiedade comparados com pacientes com TOC. Doentes com TTM tendem a ter menos sintomas de comorbidades obsessivo-compulsivo, bem como menos depressão e ansiedade em relação aos pacientes com TOC4.

Para realização de um diagnóstico diferencial consistente, outras causas de alopécia devem ser consideradas em indivíduos que negam o ato de arrancar os cabelos, como: alopécia areata, calvície com padrão masculino, lúpus eritematoso discóide crônico, líquen plano, foliculite descalvante, pseudopelada e alopécia mucinosa. Um diagnóstico separado de TTM não é dado se o comportamento é melhor explicado por outro transtorno mental10.

Os efeitos deste transtorno nas vidas destas pessoas podem ser bastante severos. Muitos deles podem ter que recorrer a perucas, óculos mesmo não precisando usá-los, arranjos de cabelo elaborados, chapéus ou bonés. Além disso, evitam ir a eventos sociais familiares, ter relacionamentos íntimos, problemas na escola, e até mesmo no trabalho. A baixa auto-estima e depressão são comuns entre pessoas com TTM. Alguns podem acabar recorrendo ao álcool ou drogas para aliviar sua infelicidade. A dificuldade em falar para outras pessoas sobre seu problema os leva muitas vezes a dizer que estão com câncer e que a perda de cabelo se deve as sessões de quimioterapia1.


2.2 - ETIOPATOGENIA


Penzel (2003)1 sugere a existência de uma falha no sistema nervoso de pessoas que sofrem de TTM. Essa falha é causada por uma predisposição genética que impossibilita a regulação de serotonina e algumas vezes dopamina, impedindo o equilíbrio do nível interno de estresse. Em sua observação as pessoas com TTM arrancam os cabelos em situações extremas que vão desde um tédio intenso ou muito estresse. Ele sugere que o ato de arrancar cabelos em pessoas com essa predisposição, funciona como uma tentativa para regular o estado interno de desequilíbrio sensorial. Assim o que se observa é que pessoas com TTM costumam procurar lugares onde existem grandes quantidades de terminações nervosas, o que aumenta a sensibilidade dos estímulos, proporcionando uma sensação excitante ou relaxante. Esses estímulos podem ser: tátil (tocar e acariciar os cabelos; puxar e arrancar os cabelos; brincar com os cabelos após tê-los arrancado; passar os cabelos nos lábios após tê-los arrancado), visual (observar o cabelo no momento em que está arrancando; examinar o cabelo que foi arrancado) ou oral (mastigação dos cabelos; consumição dos cabelos).

Dado ao que se entende agora sobre TTM, parece ser uma desordem que tem componentes biológicos e de comportamento, portanto deve contemplar duas formas básicas de tratamento: farmacoterapia e terapia cognitivo-comportamental.


2.3 - TRATAMENTO


2.3.1 - FARMACOTERAPIA


Atualmente, existem dois tratamentos que se mostram efetivos no alivio dos sintomas de TTM, são eles: medicamentos antidepressivos que incluem drogas como Prozac, Paxil, Luvox, Zoloft, Celexa, Serzone, Effexor, e Anafranil e terapia cognitivo-comportamental (TCC). Nenhum tratamento leva a uma cura, sendo que a TTM é um problema crônico. O potencial para reincidência sempre estará presente. Algumas indicações foram constituídas como dietas especiais e/ou hipnose, mas não foram cientificamente comprovados. Ocasionalmente, estas drogas podem ser aumentadas com um segundo medicamento para os ajudar na sua eficácia. Medicamentos como Risperdal, Zyprexa, Seroquel, Geodon e Abilify são freqüentemente usados para este propósito. A limitação principal de medicamentos é que embora eles parecem ter bons resultados para alguns indivíduos, não são todas as pessoas que se beneficiam deles1.


2.3.2 - TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL (TCC)


Terapia cognitiva é definida como uma abordagem estruturada, diretiva, ativa, de prazo limitado, usada para tratar transtornos psiquiátricos relacionados à ansiedade, fobias, depressão, etc. é fundamentada na racionalidade teórica de que o afeto e o comportamento de um indivíduo são em grande parte determinados pelo modo como ele estrutura o mundo, sendo que suas cognições baseiam-se em atitudes ou pressuposições desenvolvidas ao longo de sua experiência de vida11.

A situação em si não determina diretamente como a pessoa se sente; sua resposta emocional é intermediada por sua percepção da situação, ou seja, a maneira como interpreta a situação acaba prevalecendo12.

Esta visão interpretativa e particular sobre o mundo tem origem em crenças sobre si mesmas, outras pessoas e seus mundos. Tais crenças (centrais) são tão fundamentais e profundas que as pessoas não as articulam sequer para si mesmas, sendo consideradas como verdades absolutas. As crenças centrais influenciam em outra classe de crenças (intermediárias) que consiste em atitudes, regras e suposições, na qual acaba sendo expressa por pensamentos automáticos específicos à situação12.

A função do terapeuta na terapia cognitiva é ajudar o paciente a ter uma visão mais realista e adaptativa em relação aos seus problemas psicológicos e conseqüente redução dos sintomas. A terapêutica é baseada em experiências de aprendizagem e projetada para: ensinar o paciente a monitorar seus pensamentos automáticos negativos (cognições); reconhecer as conexões entre cognição, afeto e comportamento; examinar as evidências a favor e contra seu pensamento automático distorcido; substituir estas cognições tendenciosas por interpretações mais orientadas à realidade e aprender a identificar e alterar as crenças disfuncionais que predispõem a distorcer suas experiências11.

A terapia cognitiva utiliza vários métodos comportamentais, muitas vezes adaptados com vistas à mudança cognitiva. Embora seja utilizado para aumentar as atividades ou proporcionar experiências de prazer ou aprendizagem, o terapeuta cognitivo se concentrará nas mudanças de crenças que possam resultar dos métodos usados.13

Embora as primeiras terapias cognitivo-comportamentais tenham surgido no começo da década de 1960, foi apenas em 1970 que textos relativos à modificação cognitivo-comportamental começaram a surgir, alguns deles de autores como: Kendall e Hollon (1977), Mahoney (1974) e Meichenbaum (1977). As terapias cognitivo-comportamentais surgiram a partir da terapia comportamental tradicional, no entanto a principal diferença entre as duas é a incorporação da perspectiva mediacional nas abordagens cognitivo-comportamentais aos problemas13.

Um dos objetivos da TCC é corrigir as distorções cognitivas que estão gerando problemas ao indivíduo e fazer com que este desenvolva meios eficazes para enfrentá-los. Para tanto são utilizadas técnicas cognitivas que buscam identificar os pensamentos automáticos, testar estes pensamentos e substituir as distorções cognitivas. As técnicas comportamentais são empregadas para modificar condutas inadequadas relacionadas com o transtorno psiquiátrico em questão14.

O ponto de partida do tratamento é a fonte de sofrimento do paciente, ou seja, a partir das distorções que estão ocorrendo na forma do sujeito avaliar a si mesmo e ao mundo.

Um parâmetro sobre eficácia de TCC no tratamento de transtornos mentais, pode ser vista em algumas investigações sobre o TOC. O que se sabe até o momento é que 25% dos pacientes abandonam o tratamento com a TCC, mas aqueles que completam o tratamento, de 50 a 80% destes reduzem os sintomas do transtorno depois de 12 a 20 sessões e a melhora se mantém por um bom tempo. Os bons resultados requerem a participação ativa do paciente e a realização das tarefas de casa requeridas pelo psicoterapeuta15.

A chave para um tratamento bem sucedido de TTM se baseia em uma colaboração entre o cliente e terapeuta. O terapeuta fornece uma fundamentação conceitual para o tratamento, conduz a avaliação do problema com a análise funcional, e fornece a orientação sugerindo estratégias potencialmente úteis direcionados ao problema. O cliente ajuda a selecionar e dispor entre as técnicas propostas, instrumentos escolhidos e monitorar com relatórios o impacto das técnicas empregadas no tratamento. Obviamente, é importante que o cliente se torne engajado e ativo desde o início da terapia. Pode-se ajudar o cliente orientando e fornecendo uma base racional para o tratamento16.

A TCC tem sido utilizada como parte importante do tratamento de transtornos psiquiátricos, com resultados positivos nos tratamentos de TOC, transtorno afetivo bipolar (TAB), transtorno de ansiedade social (TAS), transtornos do controle do impulso (Jogo Compulsivo, Cleptomania, Compulsões Sexuais, etc).


3. OBJETIVO E MÉTODO


O objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão convencional da literatura sobre as publicações que abordam a tricotilomania e a efetividade do tratamento da terapia cognitivo-comportamental. Para tanto, realizou-se a busca de artigos pelos indexadores MEDLINE e LILACS e inclusão de artigos e livros que apresentaram dados sobre TTM e TCC cobrindo o período compreendido entre 2003 e 2007. Foram utilizadas as palavras-chaves: tricotilomania, terapia cognitivo- comportamental e terapia cognitiva.


4. RESULTADOS E DISCUSSÃO


A TTM tem sido matéria de estudo de diferentes especialidades da área de saúde como a dermatologia, psiquiatria, psicologia, gastroenterologia e até mesmo em comportamentos de animais citados por veterinários. Foram encontrados 103 trabalhos referentes a TTM no indexador MEDLINE e 8 no indexador LILACS no período, descritos na tabela 1.

Tabela 1 - Distribuição de trabalhos publicados entre 2003 e 2007.



Existem diversas publicações científicas na literatura a respeito da TTM com pacientes com mais de 20 anos. No entanto em levantamento realizado alguns dos trabalhos dizem respeito ao aparecimento da TTM em crianças e adolescentes 18,19,20.

Um dos trabalhos mais recentes estuda 46 crianças e adolescentes com TTM em que se observou uma elevada taxa de psicopatologias entre os familiares e quando submetidas à TCC com atenção a prevenção de recaídas obteve-se 77% de diminuição na severidade dos sintomas e a busca de instrumentos que possam avaliar com maior precisão as propriedades psicométricas da patologia em crianças e adolescentes. Os tratamentos que tiveram melhores resultados combinaram mais de um tipo de terapêutica combinada, sendo as mais citadas: a terapia comportamental e a farmacoterapia17.

O uso de inibidores da recaptação seletiva da serotonina tem sido recomendado pelos resultados positivos obtidos no tratamento da TTM.

Outros trabalhos fazem referência à efetividade do uso de farmacoterapia e TCC como promissores componentes no tratamento da TTM. Um dos estudos randomizados realizado por van Minnen A. et al (2003)21 com 43 pacientes portadores de TTM utilizou fluoxetina e terapia comportamental e concluiu que o tratamento com terapia comportamental foi superior ao tratamento com fluoxetina.

Piquero-Casals et al (2007)22, corrobora com outros pesquisadores que reconhecem a dificuldade de tratamento para esses casos e discutem a importância do trabalho conjunto entre diferentes especialidades na efetividade do tratamento para TTM.

Também conhecida como Síndrome de Rapunzel, o tricobezoar relacionado a tricofagia é um problema pode causar danos relevantes ao trato gastrointestinal como: obstruções intestinais, úlceras, necrose isquêmica, entre outros. Publicações que abordam casos de tricobezoar têm sido feitas principalmente por médicos cirurgiões que relatam retiradas de massa de cabelo que se estende desde o estômago até a porção do intestinal23,24,25,26 .

Os estudos de keijsers et al (2006)27 avaliam o follow up utilizando a terapia comportamental (TC) nos pacientes com TTM sendo que a TC mostrou bons resultados na redução de sintomas neste transtorno do controle dos impulsos. O objetivo do estudo foi investigar a manutenção do ganho do tratamento em longo prazo. Os sintomas relacionados a TTM - e outras características - foram avaliados em 28 pacientes de TTM antes e depois da TC breve no período de 2 anos e de 3 meses. A melhora com diminuição dos sintomas em follow up foram maiores no grupo de 2 anos com tratamento em TC breve (70%), enquanto que para o grupo de 3 meses com o mesmo tratamento a porcentagem foi de 49%. Melhores resultados de uma continuação de 2 anos foram associados com os mais baixos níveis do pré-tratamento de sintomas depressivos e com a abstinência completa do "arrancar o cabelo" após o tratamento.

As similaridades entre TOC e TTM foram investigadas extensamente. Não obstante, há uma evidência de diferenças importantes entre os dois transtornos, segundo Lochner et al (2005)4. Alguns autores conceituaram esses transtornos como se encontrando em um espectro de TOC. O método entrevistou 278 pacientes com TOC, (148 homens e 130 mulheres) e 54 pacientes de TTM (5 homens e 49 mulheres) de todas as idades. As mulheres foram comparados em variáveis demográficas e clínicas seletas, incluindo a linha central de comorbidade no eixo I e II, e os perfis da temperamento/caráter. Os pacientes de TOC relataram significativamente mais inabilidade na vida, mas poucos pacientes de TTM relataram a resposta ao tratamento. Os pacientes de TOC relataram comorbidade mais elevada, respostas mal adaptadas e incidência de abusos sexuais. Os sintomas de TOC e de TTM eram igualmente agravados durante a menstruação, mas o início de TOC ou do agravamento eram um associado mais provavelmente à gravidez/puerpério. As diferenças entre TOC e TTM podem refletir diferenças psicobiológicas subjacentes necessitando de deferentes formas de tratamento.

Tabela 2 - Síntese dos principais estudos relacionados à TTM.


5. CONCLUSÃO


A TTM é considerada um transtorno do controle dos impulsos, no entanto alguns autores discutem as semelhanças existentes entre a TTM e o TOC. No entanto o comportamento de arrancar o cabelo na TTM não tem evolução para outros rituais compulsivos como ocorre nos pacientes com TOC, o que diferencia as duas afecções.

O diagnóstico diferencial e a correta identificação do transtorno tornam-se imprescindíveis, na medida em que um tratamento adequado possa minimizar os efeitos danosos desse transtorno na vida do paciente.

A TCC tem sido amplamente utilizada para tratamentos de transtornos psiquiátricos apresentando resultados positivos. A maior parte dos estudos consultados nessa revisão revelou que a combinação de fármacos e tratamento psicoterápico tem se mostrado eficaz. Não obstante verifica-se que terapias com abordagens comportamentais, quando utilizada separadamente tem efeito superior quando comparados aos efeitos da farmacoterapia isolada.

Ainda existem poucos os trabalhos científicos realizados no Brasil sobre o tema. Assim, são necessários estudos mais detalhados acerca da TTM para um melhor entendimento sobre a fenomenologia desse tipo de transtorno do controle dos impulsos, com instrumentos de avaliação adequados e validados para população brasileira, metodologias específicas e amostras representativas que possibilitem a realização de trabalhos que obtenham dados consistentes sobre este tipo de afecção psiquiátrica.


6. REFERÊNCIAS


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